O Vedanta
Nove aspectos fundamentais
por
Swami Vivekananda
Tradução de Swami Krsnapriyananda Saraswati
(direitos reservados na forma da lei)
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Sri Ramakrishna aos pés de Kali Devi |
Amada Kali Devi!
Aos Teus pés me curvo de amor,
os tolos temem Tua forma porque não conseguem ver além da aparência;
Mas quem liga para a ignorância?
Tat Tvam Asi, aprendemos do Upanisad
Ele verteu de Tua boca silenciosa,
E assim como Tu, sou também no tempo.
Meu amor é somente compreendido por Ti
Na profundidade íntima a qual somente Tu o sabes
sou Teu menino que Te ama!
Swami Krsnapriyananda
Comentários sobre a visão do Vedanta de Swami Vivekananda
Em uma das palestras que Swami Vivekananda deu nos Estados Unidos ele disse: “Um sannyasi não pode pertencer a qualquer religião, por sua vida de pensamento independente, o qual se recolhe (afastando-se) de todas as religiões; esta é a vida de realização; não uma mera teoria ou crença, muito menos um dogma”. Até mesmo chamar Vivekananda de um ‘vedantista’ é colocar um rótulo nele injustamente.
O que então, pensarmos pelo Vedanta de Sankarachaya ou de Ramanuja, ou ainda de qualquer outro acharya? Nós intencionamos enfatizar, alguma coisa indicada pela palavra sânscrita darshana, a visão especial de uma pessoa em particular. Nós desejamos esquematizar e discutir aqui alguns dos nove pontos importantes os quais devem ser considerados características especiais do Vedanta por Vivekananda.
Antes de fazermos isso, deixe-nos primeiramente apontar o que parece ser erros frequentemente feitos no aproximar-se da vida e pensamento de Swami Vivekananda. Se nós podemos clarear o solo destes erros preconcebidos, nossos passos dentro da região de Vivekananda nos serão mais acertados.
Vejamos, então, alguns dos tópicos:
1- que Vivekananda algumas vezes foi infiel ao que Sri Ramakrishna ensinou: sua mensagem parecer ser totalmente diferente.
Réplica: em primeiro lugar, o mestre jamais ensinou a Narendra que ele teria que ser um ‘clone’ de si. Ramakrishna demostrava com frequência respeito à amplitude e nível das mentes de seus discípulos. Em segundo, deve ser lembrado que eles tinham ouvintes muito diferentes. Ramakrishna falou para ocidentais instruídos, mas ainda com muitos indianos por detrás, residentes de Calcutá, enquanto Vivekananda endereçou-se ao público americano e europeu, produtos do renascimento e da ciência, bem como da filosofia e teologia Ocidental. Em Vedanta, a mensagem é dirigida pela natureza dos receptores.
2- que Vivekananda pegou seu humanismo, socialismo, métodos de organização, etc., da sua experiência no Ocidente.
Réplica: ao ler sua vida em detalhes alguém logo descobre que ele havia estudado, e pensando, sobre as ideias de Hamilton, Herbert Spencer, Tyndall, T. H. Huxley, e outros, e como ele os costumava utilizar, antes dele retirar-se para o Ocidente. Ele fora, mesmo nos seus dias de escola, familiar com filósofos como Hume e Hegel, e um ávido leitor de John Stuart Mill.
3- Que ele fora ‘apenas’ o mensageiro do Mestre, não um poder espiritual em si mesmo
Réplica: coisa alguma pode ser favorecida deste fato. Sri Ramakrishna deu a ele o poder acumulado pelo seu próprio sadhana, em um dia decisivo em Dakshineswar, relembrado mais tarde: “Agora me tornei um mero faquir”. Vivekananda também, convidado por um dos seus irmãos-discípulos, declarou inequivocadamente: “Enquanto eu estiver na Terra, Sri Ramakrishna estará atuando através de mim, não há dúvidas”.
Vejamos agora o que deveremos chamar de os mais significantes e distintivos ensinamentos de Vivekananda.
Ele costumava sublinhar nove títulos:
1. Que unicamente a Verdade é Brahman
Isso difere um pouco de Sankara: “Apenas o Brahman é real; o mundo é falso”. Swami Vivekananda dizia que o nome mais proeminente que o homem deu a Deus era Verdade. “Minha missão”, ele disse numa entrevista em Londres, “é mostrar que religião está em tudo e é tudo”. Ele nos disse que o drama, a música e a arte, por si mesmos, é religião; que qualquer canção, de amor que seja, conduzirá à liberação de alguém, uma vez que “alma é canção”.
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Swami Vivekananda |
O mais surpreendente, ele diz: “Num certo sentido eu sou materialista, porque eu creio que há apenas o Uno. Isso é o que o materialista quer que você creia; apenas que ele o chama de matéria e eu chamo de Deus, Brahman”. Ele conhecia por experiência própria quando, após o toque do seu Mestre, ele foi às ruas e viu que tudo diante dele era Deus. Tanto por natureza, como por alma. “há apenas um único indivíduo”, ele diz, “e cada um de nós é esse”. Atma é Brahman.
2. A realização final é a identidade com Brahman
Aqui ele nos mostra a ortodoxia do Advaita. Nenhum acomodamento pode ser aceito. “Não pare até a meta ser alcançada!”, ele encorajava. Qual é a meta? Que a identidade pura, alcançada apenas pelo destemor - a qual é o porquê dele tanto falar de destemor, “Que Deus, pelo qual você tem procurado por todo o universo, é o tempo todo você mesmo, não em um sentido pessoal, mas no impessoal”. E quando os outros replicavam a Ramakrishna que isso soava como egoísmo, respondia, “Naren pode dizer isso”. “O eterno, o infinito, o onipresente, o onisciente é um princípio, não uma pessoa. Você, eu e todos, somos corporificações; que o princípio é mais do que a corporificação numa pessoa; a importância que ele tem, e tudo no final será a perfeita corporificação deste, e assim tudo será um, como agora eles são essencialmente...”. Ele nos dizia que nascemos monistas; nós não podemos aliviar disto, porque nós sempre percebemos o Uno.
3. Todos os caminhos estão fundamentados no Advaita e completos nele
Isso é o que nos impede de sermos fanáticos: que o homem não vai do erro à verdade, mas da verdade inferior à verdade superior. Quando Swamiji falava sobre Sri Krishna e o Gita, ele advertia: “Vocês devem adorar o Ser em Krishna, não Krishna como Krishna”. Ele mostrava que a natureza todo-incluída do Advaita quando dizia que o Vedanta aceita o dualismo e todos os sistemas que precedem o Advaita. Este é o solvente universal dentro do qual todas as filosofias devem fundir-se no final. Isso não é um ‘incluivismo’ nem um triunfalismo como algumas vezes é alegado. Apenas veja: “Sem o Vedanta, toda a religião é superstição (incluindo o ‘hinduísmo’); com ele, tudo se torna religião”.
4. Religião deve ser apresentada racionalmente
Foi apenas isso que Swami Vivekananda disse nas suas falas no Parlamento das Religiões em Chicago, em 1893. Isso cativou os ouvintes, os quais estavam já cansados de longos discursos emocionais, de preladores sectários. Por todos os quadrantes, o Vedanta tem sempre prescrevido, sharavanam, manamam, nididhyasanam, ouvir a verdade, triturá-la, e meditar sobre ela; aqui estava Vivekananda não apenas nos falando da sua própria fé, mas sobre todas as fés. Havia antes alguém feito isso de algum modo? “Se a religião de alguém é verdadeira”, ele apontava, “então todas as outras devem ser verdadeiras”. “O que aconteceu uma vez na história deverá acontecer novamente...”. Essa fora uma atitude científica. Ele dizia que o estudo da religião pode e deve ser aspirado nas exatas mesmas bases da busca de qualquer outra ciência. “Cada religião invoca necessidade de ser julgada pelo ponto de vista da razão”, e quando as pessoas contestavam dizendo que a “razão humana era fraca”, ele dizia para elas, “um corpo de sacerdotes deve mesmo ser fraco”. Ele ousava dizer para seus discípulos no principal monastério na Índia, “Apenas aquelas partes dos Vedas as quais concordam com a razão são aceitas como autoridade”, e também os prevenia, com relação ao Guru, “Adorem a seu Guru como Deus, mas não os obedeçam cegamente; amem-no com toda a sua vontade, mas pensem por vocês mesmos”.
5. Toda a verdade deve tornar-se disponível para todas as pessoas
“O que eu desejo propagar”, disse Vivekananta numa palestra, “o ideal de uma religião universal... é uma religião que seja equanimemente aceitável por todas as mentes; ela deve ser equanimemente filosófica; equanimemente emocional; equanimemente mística e equanimemente conduzir à ação... e este será o ideal do aproximar íntimo de uma religião universal”. Particularmente, murmurava isso dentro dos ouvidos dos seus seguidores indianos. “A mais poderosa verdade confinada dentro de nossos Upanishads, em nossos Puranas, deve ser retirada de nossos livros; retirada de nossos monastérios, das florestas, da propriedade de corpos selecionados de pessoas e espalhada e transmitida sobre toda a Terra, até que esta verdade seja como o fogo, ao redor de todo o país”. Ele disse, “O Advaita, não deve mais ser secreto... ele deve baixar-se a vida diária das pessoas. Ele deve penetrar no palácio, saindo da caverna até a casa do lavrador, ao mendigo... em todos os lugares. O oprimido, o sem casta e as mulheres não mais devem ter medo. Deixe-se uma nova Índia surgir, do homem que lavra à terra; a cabana do pescador, ao sapateiro, ao varredor de ruas...”. Em Londres, Vivekananda fez esta predição: “O poder da religião, alargado e purificado, está penetrando em cada parte da vida humana... ele viverá em cada movimento nosso; penetrará em cada poro de nossa sociedade, e será infinitamente mais um poder para o bem que tenha sido alguma vez antes”.
6. Cada um deverá incorporar todas as fases da verdade
Com isso Swami não quis dizer que não há mais necessidade de especialistas; ele intencionava a não-exclusividade. O que a atual era precisa é de pessoas maduras “Para Deus!”; ele costumava dizer que todos os elementos da filosofia, misticismo, emoções e ação foram plena e equanimemente apresentados! Este é o ideal de pessoa perfeita. “Cada um de lado só.... é limitado, e este mundo está quase lotado destas pessoas de ‘um só lado’; com o conhecimento de apenas um caminho no qual eles se movem; qualquer coisa mais é perigosa e horrível para elas. Tornar-se equilibrado e harmonioso em todas as direções é a meta ideal de religião”. Em ocasiões extraordinárias ele apontava seu Mestre como um exemplo disso, ex.: “Isso foi dado para mim”, ele disse em Madrasis, “para viver ardentemente como um homem dualista; como um ardente Advaita, como um ardente Bhakta”. Como um Jñani, Swamiji afortunadamente providenciou seu próprio bom exemplo: outro semelhante profeta equilibrado é difícil de encontrarmos. Ele foi um mestre em declarar perfeitamente as visões dos outros. Ele foi um músico, e no Ocidente teve lições de pintura na língua francesa. “Nós somos de um novo tipo”, ele dizia aos seus ouvintes; “algumas vezes vestidos como um cavalheiro, nós estamos engajados em palestras; em outras vezes, jogados de lado.. cobertos de cinzas, nós estamos mergulhados em meditação; em austeridades nas montanhas e florestas”. Esta mesma ideia ele aplicou ao modo de seu trabalho: “Eu não nasci”, Swamiji assinalava, “para fundar mais uma seita, em um mundo fervilhante delas”.
7. Todos os caminhos são feitos ativos no serviço do homem com Deus
Suponha-se que nós queremos fazer trabalho caridoso; no caso, o que Swami Vivekananda nos diz, é: “Jamais se aproxime de qualquer coisa exceto como Deus. Esse é o nosso privilégio de nos ser permitido ser caridosos, por apenas assim podermos crescer. Os pobres sofrem para que talvez os possamos ajudar; deixe-se o doador ajoelhar-se e dar graças; deixe-se o receptor erguer-se e permitir. Sinta que o recebedor é alguém mais elevado. Você serve o outro porque você é mais inferior do que ele, não porque ele está embaixo e você está no alto”. A relação de tudo isso para sobrepor ao ego é óbvia. “Filosofia, Yoga e penitências ... todos aqueles se constituem na religião de alguém ou de um país; fazer o bem para os outros é a única religião universal”. Swami Vivekananda costumava dizer para seus discípulos, “Conheçam isso com certeza: aquele quem trabalhará será a coroa em minha cabeça. O que é a Índia, a Inglaterra ou a América para nós? Nós somos os servos de Deus, que pelo ignorante é chamado de HOMEM”.
Agora, se esta atividade de servir é expressa através de todos os caminhos, então nós novamente somos relembrados de nosso primeiro ponto: o drama, a música e a arte são por si mesmos religião. O que Vivekananda pregou ele fez. Numa palestra para ouvintes americanos em São Francisco, intitulada, “É o Vedanta uma Futura Religião”, ele confidenciou: “Vocês possuem um Deus pessoal. Neste instante eu os estou adorando (em falar). Esta é a maior das orações”.
8. Que o homem é o fazedor de sua religião
O que ele quis dizer ‘por um homem’? Um ser humano, sem dúvida! “Grandes homens”, dizia Swamiji, “são aqueles quem constroem pontes para os outros, com o sangue do próprio coração”. Que a austeridade desta era não é mais penitências em florestas e meditações, mas a construção de caráter através do karma Yoga; isso é o necessário hoje.
Que a Índia em particular agora procura ter ‘músculos de ferro e nervos de aço’, aos quais nada poderá resistir; os quais podem penetrar os mistérios do universo, e realizar seus propósitos em qualquer forma, mesmo que signifique descer abaixo do oceano e encontrar-se com a morte face a face. Citando ou parafraseando algum verso de poesia, ele disse: “Nós deveremos esmagar as estrelas ao átomo, e atordoar o universo. Voce não sabe o quem nós somos? Nós somos os servos de Sri Ramakrishna!”. Algumas vezes pode alguém sentir que Deus em Swamiji era a um Homem; “Homem leitura”, ele dizia, “ele é um poema vivo”; isso não é humanismo. Isso tem uma definição mais ampla.
9. Adorar o terrível
Este, de certo modo, é o mais “pessoal” destas ênfases singulares na mensagem de Vivekananda. Ele costumava dizer, quando falava de Kali Devi, que Ela, quem primeiramente ele não pode aceitar, tinha se tornado o poder que agora o movia. “Dois ou três dias antes de Sri Ramakrishna abandonar o corpo, Ela, como ele costumava chamar Kali Devi, entrou em seu corpo. É Ela quem entrou em mim aqui e me faz atuar... eu sinto que este Poder está me dirigindo constantemente”. À parte de ser pessoal para ele, de que modo isso é uma prescrição para nós? “Cada um é responsável pelo mal em cada lugar do mundo”. Ninguém pode, realmente, “fechar a porta onde o mal reside”; todos tem que encarar, eventualmente, o Ser, em cujas mãos segura o bem e o mal, a doçura e terror. Ela, a sempre Mãe imparcial; foi o ideal escolhido por Ramakrishna, e que Swami Vivekananda obrigou-se a trazer o significado disso e transmitir isso ao mundo. “Adoração ao terrível” significa para ele e para nós, não temer mesmo a morte; a ver no mundo de hoje o tremendo jogo da energia, mostrando seu esplendor em cada caminho; entendendo-o como o Poder de Brahman em si mesmo.
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